4 Dezembro 2025

O tesouro espacial disfarçado de rocha

Em 2015, durante uma expedição no Maryborough Regional Park, próximo a Melbourne, na Austrália, David Hole se deparou com algo inusitado. Armado com um detector de metais, o garimpeiro amador desenterrou uma rocha avermelhada e surpreendentemente pesada, que repousava sobre uma camada de argila amarela. Convencido de que havia encontrado uma pepita de ouro maciço — afinal, Maryborough situa-se na histórica região de Goldfields, palco da corrida do ouro australiana no século XIX —, Hole levou o achado para casa, sem imaginar que tinha em mãos algo muito mais valioso do que o metal precioso que procurava.

Uma aposta frustrada

Determinado a acessar o suposto ouro no interior da pedra, Hole submeteu o objeto a uma verdadeira bateria de testes agressivos ao longo dos anos. Ele tentou de tudo: utilizou uma serra de pedra, uma esmerilhadeira, uma furadeira e chegou a banhar o material em ácido. No entanto, a resistência da rocha era implacável; nem mesmo golpes de marreta foram capazes de produzir uma rachadura sequer. Essa dificuldade extrema tinha um motivo que só foi descoberto muito tempo depois: o objeto não era uma pepita terrestre.

Identificação surpreendente

Intrigado com a indestrutibilidade do achado, Hole eventualmente o levou ao Museu de Melbourne para análise. Dermot Henry, geólogo da instituição, notou imediatamente as características singulares da peça. Em entrevista ao The Sydney Morning Herald, ele explicou que a rocha possuía uma aparência “esculpida” e com pequenas depressões, formato típico resultante do atrito e do derretimento externo durante a passagem pela atmosfera terrestre. A estatística jogava contra o garimpeiro: em 37 anos de carreira examinando milhares de pedras trazidas pelo público, Henry afirmou que apenas duas se revelaram meteoritos reais. A pedra de Hole era uma delas.

Composição e raridade

A densidade do objeto foi outro fator determinante para a identificação. Segundo Bill Birch, geólogo do museu, uma rocha terrestre daquele tamanho não pesaria tanto. Com impressionantes 17 quilos, o meteorito só pôde ser aberto com o auxílio de uma serra de diamante. A análise interna revelou uma alta porcentagem de ferro, classificando o achado como um condrito comum H5. O corte expôs minúsculas gotículas cristalizadas de minerais metálicos, conhecidas como côndrulos, confirmando sua origem extraterrestre.

Uma janela para o passado cósmico

O valor científico da descoberta supera, de longe, o financeiro. Henry descreve os meteoritos como a forma mais barata de exploração espacial, pois funcionam como máquinas do tempo que oferecem pistas fundamentais sobre a idade, a formação e a química do nosso Sistema Solar. Alguns exemplares contêm “poeira estelar” mais antiga que o próprio sistema solar, ou até moléculas orgânicas como aminoácidos, os blocos construtores da vida. Assim, a rocha que Hole tentou destruir acabou se revelando um testemunho intacto da evolução do universo.